Ano passado, contei aqui que escreveria um post sobre meu processo de busca por emprego, porque a verdade é que eu tenho algumas dicas e algumas percepções que podem ser valiosas para alguém, e não sabia muito bem onde as colocar. Será aqui, então.
Vamos por parte. Eu decidi sair de Portugal, porque o salário era insuficiente. Ponto. Digo, isso pode ser um texto inteiro, mas acho que fico bem parando por aqui. Daí, decidi que queria ir para outro país. O percurso mental foi assim: quero voltar pro Brasil? longos minutos pensando Não, não quero. E o Canadá? o Canadá é bom, tem certa oferta de emprego, mas você fica mais distante de outros lugares e depende de visto (aqui, caro leitor, é honesto que eu te localize no meu contexto: tenho passaporte europeu, no trem da vida eu já cheguei sentada na janelinha) Não, o Canadá não. Europa, então. longos minutos pensando Alemanha, Holanda e Irlanda.
Alemanha - país legal, já visitei, gostei bastante, mas tudo depende do alemão. Digo, é sério, até em Berlim os menus nos restaurantes são em alemão, a maioria sem tradução para o inglês. Bingo, procurei um pouco, as vagas todas pediam alemão.
Alemanha.
Irlanda - país legal, já visitei, gostei bastante, mas tem pouco sol e eu sei que a crise imobiliária tá pegando por lá também. Não como Lisboa, pouca coisa ou nada se compara a Lisboa, mas. Tenho uma amiga lá.
Irlanda: ok, mas não sei bem.
Holanda - país legal, já visitei, gostei bastante, tenho uma prima que mora lá.
Holanda.
Foi esse o processo mental.
A partir de então, enviei currículos todo santo dia, acho que para mais de 120 vagas. Não, não, não. Participei de uns seis processos seletivos no total. Não, meio sim, não. Fiquei verdadeiramente empolgada com três deles, todos na Holanda. Cheguei ao final dos três, e o que tirei disso foi que aqui eu teria realmente oportunidades de progredir na minha carreira (eu trabalho com compliance financeiro, caro leitor, para não deixar nada sem dizer).
Fui chamada para dar continuidade num processo cuja vaga era na Irlanda também, mas naquela altura eu já estava muito apaixonada com a ideia de morar na Holanda; agradeci a oportunidade, pedi desculpas e encerrei, porque, lição 1: independente do resultado final, o importante é você deixar uma boa impressão. A partir do momento em que você compreende isso, aliás, o caminho todo - que é muito desafiador, não vou mentir - se torna um bocadinho menos penoso.
Agora eu quero deixar umas dicas, vem cá.
Sites para buscar emprego: Linkedin & Indeed. Ponto. E eu sei, eu sei, o Linkedin, aquele blá blá blá todo, mas no fim do dia estamos todos navegando as contradições e as barbáries do capitalismo, antes vender uns posts bem escritos do que não ter como se manter. Cada um sabe de si. No Linkedin eu sou quem escolho que os outros pensem que sou. Você talvez queira considerar isso também - o twitteiro mediano não vai segurar suas mãos quando a coisa apertar.
Você quer que seu currículo seja atrativo, mas, pela minha experiência, não parece existir muito um padrão. Com foto, sem foto, com cor, sem cor, essas coisinhas, sabe? Acho que vai variar. Mas a dica é resumir tudo em não mais do que três páginas, creio eu.
A preparação para uma entrevista é muito importante. Toda vez que eu era chamada para uma, independente de ser uma vaga com a qual eu estava muito ou pouco empolgada, eu me dedicava a estudar quase como se estivesse prestes a fazer o vestibular. Para isso, contei muito com a ajuda da inteligência artificial, com o ChatGPT mesmo, e também com alguns vídeos do TikTok (especialmente dessa criadora de conteúdo).
Com a IA, eu sempre montava uma espécie de “roteiro” a partir da descrição da vaga e da empresa. Para isso, eu colocava algo como “me ajude a pensar em possíveis perguntas para uma entrevista de emprego para essa vaga:” *colava a descrição da vaga*. E depois ficava conversando com a ferramenta, pedindo dicas de como responder, dizendo a ela das minhas competências e perguntando como eu poderia as colocar em evidência na entrevista, etc. Tudo isso ia virando documento no Google Docs, documento esse que eu revisava com algumas cores diferentes e certamente ficava na aba ao lado em caso de emergências durante o processo - uma excelente ajudinha, que só as entrevistas virtuais proporcionam.
Dito isso, vamos às perguntas mais frequentes:
“Como você se imagina daqui a cinco anos?” - Essa aqui pode parecer um convite para você divagar sobre autoconhecimento, jornada de vida, como você esperar superar x ou y e amadurecer. Mentira. O que o recrutador quer que você diga é algo relacionado ao seu emprego, ponto. Ninguém liga verdadeiramente para os seus planos ou sonhos, seus anseios, essas coisas. Você vai dizer que se imagina progredindo na carreira, preferencialmente naquela empresa e junto com ela. Vai dizer que espera aprender e evoluir no próprio caminho profissional com o objetivo de contribuir com a empresa o máximo possível, coisa e tal.
“Me conte um pouco sobre você” - Oi, eu sou fulana, eu nasci em tal lugar, vim morar aqui há cinco anos para fazer um mestrado. Trabalhei com x, y, z. Gosto do que eu faço, porque x, y, z. Nos momentos de lazer, gosto de escrever, ouvir música, ler. Gosto muito da Taylor Swift e da Beyoncé. Amo andar de bicicleta. Também gosto de falar sobre direitos humanos e feminismo.
Em inglês fica mais fácil, acho que faz mais sentido, “I’m passionate about (…)Com esse finalzinho você tem que ter consideravelmente mais cuidado, mas acho que vai de “perceber” o seu interlocutor. Se for uma empresa que se vangloria de defender a igualdade de gênero, por exemplo, evidente que essa vai ser uma fala bem recebida. O segredo é dizer o que querem escutar. Você não vai divagar longamente sobre suas inclinações políticas, mas pode ir até o ponto em que você sabe que não vai “pegar mal”. Lembre-se, você está vendendo o seu peixe. O seu feminismo é sobre igualdade de gênero nos espaços, claro - e, para os fins aqui expostos, isso é suficiente.“Me diga um pouco sobre sua maior fraqueza e como você faz para lidar com ela” - Também com a variação “me conte sobre um momento difícil no trabalho e como você fez para resolver a situação”. Aqui, eles querem que você seja sincera, mas só até certo ponto. O truque é contar como você acabou se dando bem no final. Um exemplo: se eu tenho questões com como lido com o meu tempo e como estabeleço prioridades, digo isso, mas menciono também que fiz um curso de gestão de tempo para aprender alguns truques. Se eu tenho questões com falar em público, digo que já estou ativamente conversando sobre isso em terapia e tentando exercitar a fala pública mais frequentemente. Assim, eu assumo que há um ponto a ser trabalhado - que indica que você tem humildade para reconhecer que não é perfeita, dã - e demonstro que já estou a par da situação e buscando ferramentas para melhorar. E o que mais você poderia querer de um empregado, certo? Confia em mim.
“Por que você quer trabalhar na empresa x?” - Seu objetivo aqui vai ser falar da empresa, demonstrando que você estudou sobre ela. Vai dizer que é uma empresa cujos ideais se alinham super com os seus. Os objetivos, os planos, o crescimento, os elogios que você leu sobre a empresa no TrustPilot e no Glassdoor (outro site que recomendo que você conheça muito bem, onde você vai encontrar reviews anônimas de pessoas que já trabalharam em tais empresas, inclusive com possíveis dicas de perguntas de entrevistas, média salarial, coisa e tal). A novidade que foi postada semana passada, no Linkedin, pelo CEO. É claro que você quer trabalhar lá, quem é que não quer?
“Por que nós deveríamos te contratar?” - O pulo do gato é relacionar essa resposta à pergunta anterior. Você é a pessoal ideal para trabalhar naquela empresa, posto que, veja, se é uma empresa que, de novo, se vangloria de promover a igualdade de gênero, um dos seus ideais é esse também. Se é uma empresa que ano passado recebeu um prêmio por isso e isso, você, tendo experiência nisso e naquilo, vai acrescentar muito à equipe. Porque você está pronta para um novo desafio, porque é o percurso natural e que mais combina com a sua experiência, porque você sente que pode contribuir para que a empresa alcance tal objetivo. Novamente, não tenha medo de se vender, com moderação. O jogo é pensado assim mesmo.
Esse foi um texto sem nada de inspiração ou conclusão, caro leitor, eu só queria mesmo registrar o que andei aprendendo nessa pós-graduação natural da vida adulta. Para mim mesma, para você, para quem chegar aqui de repente. Eu prometo que em breve volto com alguma divagação barata da vida.
Mais uma vez, obrigada por me ler.
Fica bem, a gente vai se falando.
Excelente texto, Rafa! Estou em transição de carreira, então veio em boa hora! Obrigada por compartilhar sua experiência!
Continue sempre escrevendo textões. Faz um bem danado pra vc e pros seu leitores. ❤️